Discurso do Embaixador Dean Pittman na Recepção de Exibição da Arte nas Embaixadas

Inácio Pereira, fotojornalista do jornal Domingo discutindo arte com o escritor Aurélio Furdela.

Maputo,

17 de Agosto,

Boa noite.

Se ainda não tive oportunidade de vos conhecer pessoalmente esta noite, o meu nome é Dean Pittman, e tenho o prazer de ser vosso anfitrião esta noite e também de ser o Embaixador dos E.U.A. para Moçambique.  O Chris e eu temos o prazer de vos acolher na nossa casa, e especialmente de partilhar esta colecção de quadros e fotos dos Estados Unidos.

Vocês foram especificamente convidados porque são artistas, são casados com um artista ou, como nós, amam a arte e acreditam que ela desempenha uma função importante nas nossas vidas.  O programa Arte nas Embaixadas, através do qual adquirimos as belas peças que podem apreciar esta noite, foi lançado pelo Governo dos E.U.A. no início da década de 1960 com a convicção de que a arte conta histórias.

Essas histórias podem ser intensamente pessoais, e ao mesmo tempo universais.  Podem estar ligadas a um lugar e época específica, e no entanto ser intemporais na sua beleza.  O que é mais importante ainda neste nosso mundo da diplomacia, estas histórias podem criar ligações poderosas entre indivíduos, e entre nações.

Gostaria de vos falar especificamente de três obras que vão ver, ou até que já viram aqui esta noite, e as histórias que elas me contam.  Vou mostrá-las no ecrã, mas gostariam que tomassem alguns minutos para as apreciar ao vivo aqui na residência onde estão instaladas nas suas molduras.  E quero salientar que essas três histórias estão ligadas ao grande estado do Mississípi de onde eu venho.

Esta primeira obra é uma foto tirada em Jackson, Mississípi na década de 1930, durante a Grande Depressão, uma época de privação económica severa para a maioria dos americanos que a viveram, particularmente afro-americanos, e especialmente os afro-americanos no Sul.  E no entanto aqui está esta mulher afro-americana, muito bem vestida e com uns belos sapatos, de chapéu, olhando para algo interessante numa vitrina, talvez algo que quer comprar.

Sabendo o que sei sobre Jackson, Mississípi nesse ponto particular da história da nossa nação, interrogo-me se ela teria podido entrar nessa loja.  Será que podia entrar, considerando a cor da sua pele?  Infelizmente, é provável que não.

Portanto, como todas as grandes fotos que retratam pessoas na sua labuta diária, esta foto captura um momento específico no tempo, mas também levanta muitas questões acerca dos indivíduos apresentados. O que é ainda mais especial acerca desta foto é o facto de ter sido tirada por Eudora Welty, uma compatriota do Mississípi que, depois desta foto, se tornou uma das escritoras americanas de contos mais influentes.  Os artistas, sejam eles americanos ou moçambicanos, não toleram cativeiro, seja ele nas suas ideias ou na sua forma.

Esta segunda história vem de um fotógrafo que passou três meses sozinho remando Mississípi abaixo numa canoa.  Trata-se de um bando de pelicanos levantando voo do rio.  E embora talvez se possa pensar que um bando de pássaros a levantar voo é uma cena caótica, entre as nuvens e a luz e composição, esta foto captura um certo padrão.

Portanto o que é especial para mim é que, seja no Rio Mississípi ou na Gorongosa, existem padrões na natureza que muitas vezes não vemos, a menos que prestemos atenção.  Mas quando os vemos, como os desta foto, tocam-nos fundo no coração.  Não sei bem explicar porque esta foto me atrai, mas é por isso mesmo ainda mais poderosa.

Finalmente, temos um quadro abstracto de uma outra compatriota do Mississípi – uma mulher que eu conheci, por acaso – chamada Bess Phipps Dawson.  Tal como nos pássaros, existe um caos aqui, um motim absoluto de cores, formas e texturas.  Mas eu gostaria que tentassem uma coisa.  Vou ficar calado um momento, e vou pedir que se concentrem no quadrado azul neste quadro.

Não sei se vos acontece o mesmo, mas quando eu olho para esse quadrado azul, sinto que estou quase a flutuar nesse quadro, e apesar de todas as cores, formas e movimento, encho-me de tranquilidade, e paz.  Não sei se era essa a intenção da Senhora Dawson, mas francamente, não importa.  O que é tão maravilhoso nos quadros, ou fotografias, ou canções, ou livros, ou filmes, é que mesmo quando o artista infunde uma história ou um certo significado na sua obra, outra pessoa, mesmo alguém de uma cultura ou país diferente, pode retirar da obra uma história completamente diferente, mas igualmente poderosa.

Portanto mais uma vez vos dou as boas-vindas à nossa casa, e encorajo-vos a visitar estas fotografias e quadros e a ouvir as histórias que têm para contar.  Muito obrigado por se juntarem a nós, e desejo-vos uma noite maravilhosa.